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Cada prémio é "mais um muro que destruímos e mais uma ponte que construímos"

INTRO

 

Celmira Macedo dispensa apresentações! Apesar de ter nascido em Angola, foi adotada por Trás-os-Montes, cede se destacando como uma autêntica Mulher do Norte, de alma e de garra. No seu mui extenso currículo, contam-se dezenas de prémios nacionais e internacionais, sendo, muito provavelmente, mais conhecida e respeitada lá fora do que em Portugal. O seu percurso diz tudo. Doutorada em Educação pela Universidade de Salamanca, a professora e inventora da Ekui já ajudou milhares de crianças com necessidades especiais em todo o mundo, combatendo aquele que é um problema social, através da dinamização nas escolas, de uma metodologia multissensorial inclusiva que, simplifica e acelera a aprendizagem, potencia a comunicação e desenvolve a empatia.

Especialista em inovação e empreendedorismo social pelo Insead, a criadora da Metodologia EKUI, considerada pela HundrEd como uma das melhores inovações educativas do mundo pelo segundo ano consecutivo (2023/2024), é, também, uma Ashoka Fellow desde 2021, tendo sido integrada, já este ano, no TOP 100 das mulheres líderes em empreendedorismo social e inovação na Europa, prémio atribuído pela euclid.network.

 

ENTREVISTA

 

Kapital do NordestE (KNE): Depois de, recentemente, a metodologia inclusiva ter sido galardoada com o Primeiro Prémio Magallanes – El Cano, em Sevilha, EKUI volta a ser notícia, a 31 de outubro, ao integrar, pela segunda vez, a lista das 100 “mais importantes e escaláveis inovações educativas do mundo” da Hundred. Explica-nos que distinção é essa e qual a sua importância?

Celmira Macedo (CM): Pela segunda vez consecutiva, fazemos parte desta lista e voltamos a ser o único projeto português ao lado dos melhores na área da educação. Ser selecionada para a HundrED Global Collection é uma honra para qualquer inovação educativa e por vários motivos. A HundED é uma organização com sede na Finlândia, o país considerado o ex-líbris da educação, da qual fazem parte milhares de especialistas de mais de 190 países de todo o mundo que avaliam, criteriosamente, cada inovação educativa de milhares que recebem e dessas, apenas 100, fazem parte desta coleção.

Em suma, estar na HundrED Global Collection, pelo segundo ano consecutivo, faz-nos acreditar que estamos no caminho certo, quer ao nível da eficácia da metodologia EKUI como da sua eficiência e impacto. Além do mais, permitiu-nos estabelecer contactos com parceiros que a reconhecem e validaram como uma solução inovadora e eficiente com um grande potencial de escala e impacto mundial.

 

KNE: Conquistaste, também, a 8 de novembro, o prémio @Sonae Educação no Innovators Forum'23, mas tantas distinções e galardões não são tudo, certo? Pois, apesar do reconhecimento estrangeiro, há algo mais que gostarias de granjear, dentro de portas, a nível governamental?

CM: Todos os prémios nacionais e internacionais que temos vindo a receber, tanto o HundrED como, agora, o da SONAE Educação, trazem o reconhecimento, validade e notoriedade à metodologia EKUI no ecossistema educativo, o que veio exponenciar a visibilidade em Portugal. Penso que, e sobretudo depois da avaliação de impacto que realizamos com mais de 1000 alunos do Sabugal e Fundão, avaliação esta em terreno, em pré e pós intervenção, acompanhada e monitorizada pela UBI e pela FPCEUP, em que o grupo experimental (turmas onde a EKUI estava a ser implementada) obteve resultados muito superiores ao Grupo de Controle, em áreas como a alfabetização e comunicação, o que mostra que estão reunidas as condições de sermos reconhecidos pelo Ministério da Educação, e fazer parte das suas sugestões de boas práticas como tantos projetos que conhecemos.

Por outro lado, fomos o primeiro projeto educativo a trazer para Portugal o conceito de Desenho Universal para a Aprendizagem. De forma direta ou indireta, acreditamos que a EKUI influenciou a política pública. Desde 2015 que estamos a trabalhar nas escolas com o conceito de Desenho Universal para a Aprendizagem*, conceito desenvolvido nos Estados Unidos na década de 90, mas que só veio para Portugal através do Decreto-Lei 54 em 2018, três anos depois de estarmos a trabalhar sob este pressuposto científico.

 

KNE: Tanto assim que, entre uma centena de empreendedores presentes em Helsínquia, a EKUI era a única inovação a não receber qualquer apoio do Governo? É grave e se sim em que medida?

CM: Por sermos o único projeto português a ser reconhecido na história daquela organização, teria sido muito interessante termos alguém do Ministério da Educação a valorizar este feito. Contudo, tivemos a honra de um representante da embaixada de Portugal em Helsínquia ter ido dar-nos os parabéns e sentimos muito orgulho nisso, mas foi em Helsínquia.

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KNE: O que é que consideras que falte ao Governo para avançar com a inclusão da Ekui no sistema de ensino ou, pelo menos, que o recomende, de forma a que entidades e escolas reconheçam no teu projeto o selo oficial do Governo? E porque é que isso é assim tão importante, uma vez que está mais que provado que a metodologia funciona?

CM: Sinceramente? Não sei. Claro que é importante! Até porque todos os dias recebemos pedidos de professores e de escolas, públicas e privadas, para a capacitação de profissionais, pais e comunidade educativa para a implementação nas turmas da metodologia EKUI. Agora, obviamente, que este selo seria muito importante, mais até para os professores. E se isto não acontecer em Portugal, a possibilidade de fazê-lo lá fora, noutro país, é cada vez maior.

 

KNE: Após a Finlândia, regressaste a Portugal para seres finalista no Innovators Forum 23, organizado pela Sonae e que teve lugar no LxFactory em Lisboa, tendo sido o teu projeto um de dois premiados. É só mais um entre tantos outros ou todos contam em igual medida?

CM: Todos os reconhecimentos contam, pois cada um deles é mais um muro que destruímos e mais uma ponte que construímos. Cada um é um meio e uma estratégia para eliminar barreiras na aprendizagem das crianças, sobretudo, das mais desfavorecidas. Por isso, cada passo dado nesta caminhada conta. Só assim esbateremos as desigualdades e seremos uma escola que pode ser, efetivamente, um elevador social.

 

KNE: Se pudesses definir o futuro, o que é que gostarias que acontecesse em relação ao teu “bebé”? Ou melhor, onde vês a metodologia EKUI daqui a 15, 20 anos?

CM: Vejo-a em Espanha e na América Latina muito rapidamente e, depois, vejo-a no mundo! Demore o tempo que demorar, a estratégia está definida.

 

KNE: Sendo mulher e um exemplo para todas as jovens que queiram colocar suor, sangue e lágrimas, basicamente, a alma, num projeto em que realmente acreditam, qual ou quais os conselhos que tu lhes darias?

CM: Nunca desistam daquilo em que acreditam, mas validem cientificamente as vossas soluções e até os problemas que querem mitigar. A validação científica recorrente é necessária, deve ser o vosso suporte, tal como a resiliência, e essa, essa vão precisar dela muito.

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O Desenho Universal para a Aprendizagem (DUA) é uma abordagem educativa que visa tornar o ambiente de aprendizagem acessível a todos os alunos, independentemente das suas capacidades, necessidades e ritmos de aprendizagem. Em vez de adotar uma abordagem única e padronizada, o DUA reconhece a diversidade dos alunos e oferece múltiplas formas de representação e expressão da informação, potenciando o envolvimento na aprendizagem. Tal como a EKUI, o Desenho Universal para a Aprendizagem visa eliminar barreiras na aprendizagem, promovendo uma abordagem mais inclusiva e personalizada, reconhecendo e valorizando a diversidade de todas as crianças e jovens.

 

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